Entrevista Inédita: André Trigueiro



André Trigueiro
Orador e Escritor Espírita

Wellerson Santos (Wellerson): Segundo os estudiosos, os problemas que temos enfrentado, como o efeito estufa, o aquecimento global e o escasseamento de água, por exemplo, tendem a piorar, se continuarmos com as mesmas atitudes que temos tomado até o momento. Nesta etapa evolutiva da Terra, quando saímos de um Mundo de Provas e Expiações e passamos para um Mundo de Regeneração, como isso se dá em relação aos aspectos ecológicos? Como podemos entender esse processo, analisando aquilo que os estudiosos trazem e o que a Espiritualidade nos informa, sendo o Mundo de Regeneração um Mundo de Paz, de transformação interior?

André Trigueiro (André): É importante não confundirmos Mundo de Regeneração no seu sentido mais elevado, ética e moralmente, com um processo inerente aos ecossistemas do Planeta, às leis que regem a vida na Terra, a esse software inteligente chamado natureza, que independe da evolução moral daqueles que merecerem reencarnar aqui.
Em bom português o que estou querendo dizer é o seguinte: se prestarmos atenção ao que disse Santo Agostinho em O Evangelho Segundo o Espiritismo, ao descrever as diferentes categorias de mundos habitados, a descrição de Mundo de Regeneração é um lugar, onde, ainda, há dor, mas não na forma como a dor e o sofrimento são experimentados no Mundo de Provas e Expiações. Não é um mundo perfeito, assevera Santo Agostinho, e ele alude às questões morais.
Do ponto de vista da saúde ecológica do Planeta a história é outra.
Assim, é possível nós imaginarmos um Mundo mais evoluído ético-moralmente, mas trazendo um legado terrível, de uma conduta não compatível com a reveliência da nossa Casa Planetária. Ela não suporta qualquer tipo de agressão, existem os limites que precisam ser respeitados.
Não respeitar esses limites significa deixar como legado ao Mundo de Regeneração: a poluição do ar, a poluição da água, a desertificação do solo, transgenia irresponsável, produção monumental de lixo, mudança climática, destruição sistemática da biodiversidade e outros fatores, que tornariam esta Casa Planetária hostil à vida, apesar de sua evolução ética e moral.
É uma questão para pensarmos.

Wellerson: Você poderia apresentar uma panorâmica do seu livro: Ecologia e Espiritismo, relacionando-a à obra de Chico Xavier? Como foi esse trabalho?

André: Essa foi a idéia da explanação feita aqui, por mim, neste III Congresso Espírita Brasileiro.
A obra de Chico Xavier, principalmente, por meio dos trabalhos de Emmanuel e André Luiz, abordou muito a configuração da vida no Planeta, a importância de não desrespeitarmos os limites da Terra, sobre como nós e o Planeta nos confundimos.
Em mensagem de André Luiz no livro Ideal Espírita, por exemplo, ele diz que não é possível imaginar a Paz sem que percebamos que estamos dentro de um processo onde todos estão interligados, onde somos todos interdependentes e interagimos o tempo todo.
O Universo é sistêmico, há um conjunto de fenômenos que possui essa característica de um intercâmbio intenso e incessante. Onde a natureza não tem saúde, vitalidade e residência, há escassez. Onde há escassez não há condições propícias à vida. Onde não há condições propícias
à vida, há conflito, há disputa. “Farinha pouca, o meu pirão primeiro”.
A História da Humanidade nos mostra esse tipo de comportamento.
Não é por acaso que, em 2004, o Comitê Nobel, pela primeira vez, conferiu o Prêmio Nobel da Paz a um ambientalista. O que tem a ver meio ambiente e paz? Tudo, tudo a ver.
Quando sobreveio a catástrofe do Furacão Katrina sobre Nova Orleans, foi disparado um alerta para que a população do Sul dos Estados Unidos deixasse a região. Quem não tinha dinheiro, os pobres, e naquela região majoritariamente os negros, refugiou-se em abrigos públicos. Um desses abrigos foi o Estádio de Basquete ou Ginásio chamado Super Dome. A previsão era
apenas passar dois dias ali no Super Dome, só que o furacão destruiu a represa e aquela água fétida do Rio Mississipi inundou Nova Orleans. Dois dias se transformaram em quase duas semanas. Quando começaram os rumores de que faltariam água e comida, não seria possível alimentar a todos adequadamente, o comportamento de vinte mil pessoas dentro desse Ginásio alterou-se significativamente. Tivemos registros de homicídios, suicídios, estupros, barbárie dentro do Ginásio, porque surgiram os rumores de escassez – isso está registrado, aconteceu há seis anos atrás, não mais do que isso.
Nós precisamos saber cuidar para não faltar. Porque onde falta, não é uma regra absoluta, precipita-se uma atenção que não favorece a paz.

Wellerson: Você fez um trabalho inédito dentro da Doutrina Espírita no que se refere à Ecologia. Chico Xavier, também, o fez, mas de forma esparsa, não concentradamente como você. Qual é a postura que devemos adotar em relação ao nosso Planeta? Enquanto espíritas que somos como podemos auxiliar na conscientização das outras pessoas?

André: Isso extrapola o Espiritismo, mas – respondendo à sua pergunta – nós, enquanto espíritas, precisamos ser sustentáveis.
Precisamos consumir com consciência, precisamos prestar atenção no hábito de consumir e não extrapolar o limite do necessário. Está na Lei de Conservação em O Livro dos Espíritos o que é necessário e o que é supérfluo.
Aquele que é consumista e assume ser não está entendendo a Doutrina.
A Doutrina Espírita deixa muito claro que uma característica dos Mundos Primitivos é o apego à matéria.
O consumista o que é? É alguém refém de produtos, de marcas de grife, de acumulação de bens e de posses, de um closet abarrotado de toalhas, de edredons, de sapatos, de roupas. Isto não é, propriamente, até onde eu entendi a Doutrina, uma conduta espírita.
Então, devemos consumir com consciência. Separar o lixo. Nós não podemos deixar como legado, no Planeta em que poderemos reencarnar, o lixo na profusão que produzimos. Reciclar é uma atitude espírita.
Consumir água e energia com ética, porque são recursos invariavelmente finitos.
No momento, não é possível imaginar que nós não tenhamos para com a água uma conduta mais racional. Impedir goteiras, infiltrações e vazamentos; reaproveitar a água da máquina de lavar para múltiplos usos higiênicos, lavando o carro, o chão da cozinha, o vidro; coletar água da
chuva. Nós não fazemos isso por quê?
Esse é o país que tem o maior índice pluviométrico do Planeta. Por causa da bacia do Rio Amazonas, há muita chuva no Brasil. Em países tropicais chove muito. Todas as casas e edifícios têm calhas que vertem a água da chuva direto para o ralo e nós pagamos tarifa de água cada vez mais cara, porque os mananciais estão cada vez mais degradados e o custo do tratamento se eleva exponencialmente.
Então, basicamente, eu acredito que precisamos prestar atenção em hábitos, comportamentos e padrões de consumo. E sermos muito rigorosos em relação a isso, porque errar é humano, mas nós já perdemos o direito de errar quanto a esses aspectos. Não faltam mais informações, não
faltam mais alertas. Diferentes relatórios convergem na mesma direção: se nós não corrigirmos o rumo, há o risco de um colapso.
O colapso seria a incapacidade dos ecossistemas do Planeta de proverem a Humanidade do que ela vem demandando, progressivamente, em termos de matéria prima e de energia.
Agora, não há plano B, não tem outro planeta. Do ponto de vista dos encarnados, não tem arca em que, na hora do abalo, todo mundo pega carona ou possa fugir num rabo de foguete.
Esse é o Planeta que possuímos, essa é a nossa Casa Sideral, e a sua preservação é missão de todo espírita, porque precisamos entender isso como missão. Eu tenho a minha missão, mas conjuguemos isso no plural, porque são várias: ser bom pai, bom filho, bom vizinho, bom profissional e ser uma pessoa que está antenada com as necessidades da sua sociedade e do seu Planeta.
O Planeta está pedindo ajuda, mas o que o espírita está preparado para oferecer?

Um comentário:

  1. Esta entrevista é por demais oportuna, a fim de que acordemos enquanto é tempo...

    ResponderExcluir

Deixe aqui os seus comentários com o seu contato.
Muito obrigado!